05/05/2009

VISITA A TORMES


«Um ar fino e puro entrava na alma, e na alma espalhava alegria e força. Um esparso tilintar de chocalhos de guizos morria pelas quebradas»

A Cidade e as Serras


A "OFICINA DA LEITURA" organiza uma visita a Tormes no próximo dia 9 de Maio, destinada a professores, alunos, funcionários e encarregados de educação.

O programa inclui o visionamento de um documentário sobre a vida e obra de Eça de Queiroz, visita guiada à Fundação e almoço com ementa queiroziana, a saber:
. Entradas típicas da região
. Sopa Juliana
. Bacalhau com pimentos e grão-de-bico
. Creme queimado
. Vinho de Tormes (evidentemente)

Para abrir o apetite a uma leitura mais aprofundada da obra deste nosso grande escritor, nascido na Póvoa de Varzim, a seguir reproduzimos um texto retirado de uma carta endereçada ao Director da Companhia das Águas e membro do Partido Legitimista da época, revelador do seu espírito irreverente e da sua prosa acutilante.


"Il.mo e Ex.mo Senhor Carlos Pinto Coelho, digno director da Companhia das Águas e digno membro do Partido Legitimista:

Dois factos igualmente graves e igualmente importantes, para mim, me levam a dirigir a V. Exª estas humildes regras: o primeiro é a tomada de Cuenca e as últimas vitórias das forças Carlistas sobre as tropas Republicanas em Espanha; o segundo é a falta de água na minha cozinha e no meu quarto de banho.
Abundaram os Carlistas e escassearam as águas, eis uma coincidência histórica que deve comover duplamente uma alma sobre a qual pesa, como na de V. Exª, a responsabilidade da canalização e a do direito divino.
Se eu tiver a fortuna de exacerbar até ás lágrimas a justa comoção de V. Exª, que eu interponha o meu contador, Ex.mo Senhor, que eu o interponha nas relações de sensibilidade de V. Exªcom o Mundo externo; e que essas lágrimas benditas de industrial e de político caiam na minha banheira!
E, pago este tributo aos nossos afectos, falemos um pouco, se V. Exª o permite, dos nossos contratos. Em virtude do meu escrito, devidamente firmado por V. Exªe por mim, temos nós um para com o outro um certo número de direitos e encargos. Eu obriguei-me para com V. Exªa pagar o desvio de uma encanação, o aluguer dum contador e o preço de água que consumisse.
V. Exª pela sua parte obrigou-se para comigo a fornecer a água do meu consumo. V. Exª fornecia, eu pagava. Faltamos evidentemente à fé deste contrato: eu se não pagar, V. Exªse não fornecer.
Se eu não pagar, faz isto: corta-me a encanação. Quando V. Exª não fornece o que hei-de eu fazer, Ex.mo Senhor? É evidente que para que o nosso contrato não seja inteiramente leonino, eu preciso, no análogo àquele em que V.Exª me cortaria a mim a canalização, de cortar alguma coisa a V. Exª.
Oh! E hei-de cortar-lha!...
Eu não peço indemnização pela perda que estou sofrendo, eu não peço contas, eu não peço explicações, eu chego a nem sequer pedir água.
Não quero pôr a Companhia em dificuldades, não quero causar-lhe desgostos, nem prejuízos...
Quero apenas esta pequena desafronta, bem simples e bem razoável, perante o direito e a justiça distribuída - quero cortar uma coisa a V. Exª!
Rogo-lhe, Ex.mo Senhor, a especial fineza de me dizer, imediatamente, peremptoriamente, sem evasivas nem tergiversações qual é a coisa que, no mais santo uso do seu pleno direito, eu posso cortar a V. Exª
Tenho a honra de ser
De V. Exª com muita consideração e com umas tesouras

Eça de Queiroz"

3 comentários:

CLUBE DAS LÍNGUAS VIVAS disse...

Mas que ideia saborosa...
Há lugar para mais um? :-)

BRISADAREOSA disse...

Há sim senhor... para mais um ou para mais dois :):)

Anónimo disse...

Oficina da Leitura: Em Julho iremos organizar outra visita. Depois daremos notícias. Há sempre lugar para mais um...